"Arquiteto é tudo limitado"
Esses dias, saindo da faculdade, encontro com uma roda de conhecidos, que fazem engenharia civil e começo a ouvir o papo:
_ Arquiteto tem 4.000 horas de projetos.
_ Nós, engenheiros, temos 4.000 horas de cálculos.
_ Mas os arquitetos também tem cálculo na grade, então eles podem calcular.
_ Podem sim, mas só podem projetar até 4 andares.
Foi nessa hora que eu entrei na conversa:
_ O que??? Quem te disso isso?
E o papo continuou...
_ É verdade, meu professor quem disse.
_ É isso mesmo, acima de 4 andares, só engenheiros que podem assinar.
Então fui pesquisar isso a fundo.
É incrível como boatos acabam se tornando verdades absolutas pra muita gente. Teorias da conspiração, iluminates, tomar leite e chupar manga e tantas outras só estão vivas até hoje porque a explicação correta é muito mais longa e complexa, exige pesquisa e comparação e é mais fácil achar uma explicação mais simples e direta, mesmo que essa seja pura mentira. Nós precisamos saber o porquê de tudo, nosso cérebro tem essa necessidade deste que se reconhece com ser vivo e culturalmente, já que todos nós passamos, quando criança pela faze do “por quê?” Aprendemos que é mais fácil ouvir os outros que estudar, pesquisar, comparar, meditar e entender. Então vamos aos fatos:
A nossa profissão de arquiteto e urbanista tem passado por uma série de reformas desde a criação do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU). Sim nós temos um conselho só nosso agora. Anteriormente nossa profissão era regida pelo Conselho de Engenharia e Agronomia (Sistema CONFEA/CREA).
Durante esse período, a nossa profissão estava regida pela Lei Federal 5.194/1966 e regulamentada pela Resolução CONFEA 1.010/2005. E nestes dois requisitos legais encontramos exatamente o que se dizia de atribuição profissional. Dê só uma olhada;
LEI 5.194 de 24/12/1966
Art. 7º As atividades e atribuições profissionais do engenheiro, do arquiteto e do engenheiro-agrônomo consistem em:
(…)
b) planejamento ou projeto, em geral, de regiões, zonas, cidades, obras, estruturas, transportes, explorações de recursos naturais e desenvolvimento da produção industrial e agropecuária;
c) estudos, projetos, análises, avaliações, vistorias, perícias, pareceres e divulgação técnica;
d) ensino, pesquisas, experimentação e ensaios;
e) fiscalização de obras e serviços técnicos;
f) direção de obras e serviços técnicos;
g) execução de obras e serviços técnicos;
Nos termos da lei, todas as atividades descritas são competências comuns aos profissionais de Engenharia, Arquitetura e Agronomia.
Mas a redação desta lei estava genérica, e coube ao CONFEA emitir uma Resolução (1.010/2005) que tem força de lei, para fins de fiscalização, detalhando mais estas atividades profissionais.
Resolução CONFEA nº 1.010 de 22/08/2005
Art. 6º Aos profissionais dos vários níveis de formação das profissões inseridas no Sistema Confea/Crea é dada atribuição para o desempenho integral ou parcial das atividades (…), a sistematização dos campos de atuação profissional estabelecida no Anexo II, e as seguintes disposições:
I – ao técnico, ao tecnólogo, ao engenheiro, ao arquiteto e urbanista, ao engenheiro agrônomo, ao geólogo, ao geógrafo, e ao meteorologista compete o desempenho de atividades no(s) seu(s) respectivo(s) campo(s).
O Anexo II da Resolução é bastante extenso e detalha várias atividades no campo profissional, o qual assinalarei algumas bem interessantes:
ANEXO II
2. CATEGORIA ARQUITETURA E URBANISMO 2.1 – CAMPOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DA ARQUITETURA E URBANISMO2.1.2 – ÂMBITO DA TECNOLOGIA DE CONSTRUÇÃO
Sistemas Estruturais em Edificações:
– Estruturas;
– Desenvolvimento de Estruturas;
– Aplicação Tecnológica de Estruturas e Instalações;
– Instalações, Equipamentos, Dispositivos e Componentes referentes à Arquitetura, Urbanismo, Instalações Elétricas em Baixa Tensão para fins residenciais e comerciais de pequeno porte, Tubulações Telefônicas para fins residenciais e comerciais de pequeno porte, tubulações de lógica para fins residenciais e comerciais de pequeno porte.
Procurei saber sobre a expressão: “pequeno porte” e constatei que é uma referência à edificações comerciais, não industriais já que estas não serão supridas por instalações de baixa tensão (110v – 220v).
Como podemos ver, o mito de que arquitetos e urbanistas tem limitações não passa de mito mesmo, sem um fundo de verdade, de acordo com a Lei Brasileira. Mas você sabe quais as atribuições de um arquiteto? Mais uma vez me basearei em algo concreto, no caso Leis e Resoluções de Conselhos Profissionais.
No que compete as atribuições ao novo Conselho de Arquitetura e Urbanismo definidas pela Lei Federal nº 12.378 de 31/12/2010, foi emitida a Resoluções CAU/BR 21/2012, que dispõe os destaques:
Resolução CAU/BR Nº 21 de 05/04/2012
Art. 3º. Para fins de Registro de Responsabilidade Técnica (RRT), definido em Resolução própria do CAU/BR, as atribuições profissionais dos arquitetos e urbanistas serão representadas no Sistema de Informação e Comunicação do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (SICCAU) através das seguintes atividades:
(…)
2. EXECUÇÃO
2.1. ARQUITETURA DAS EDIFICAÇÕES
2.1.1. Execução de obra;
2.1.2. Execução de reforma de edificação;
2.1.3. Execução de edifício efêmero ou instalações efêmeras;
2.1.4. Execução de monumento;
2.1.5. Execução de adequação de acessibilidade.
2.2. SISTEMAS CONSTRUTIVOS E ESTRUTURAIS
2.2.1. Execução de estrutura de madeira;
2.2.2. Execução de estrutura de concreto;
2.2.3. Execução de estrutura pré-fabricada;
2.2.4. Execução de estrutura metálica;
2.2.5. Execução de estruturas mistas;
2.2.6. Execução de outras estruturas;
(…)
2.5. INSTALAÇÕES E EQUIPAMENTOS REFERENTES À ARQUITETURA
2.5.1. Execução de instalações hidrossanitárias prediais;
2.5.2. Execução de instalações prediais de águas pluviais;
2.5.3. Execução de instalações prediais de gás canalizado;
2.5.4. Execução de instalações prediais de gases medicinais;
2.5.5. Execução de instalações prediais de prevenção e combate a incêndio;
2.5.6. Execução de sistemas prediais de proteção contra incêndios e catástrofes;
2.5.7. Execução de instalações elétricas prediais de baixa tensão;
2.5.8. Execução de instalações telefônicas prediais;
2.5.9. Execução de instalações prediais de TV;
2.5.10. Execução de comunicação visual para edificações;
2.5.11. Execução de cabeamento estruturado, automação e lógica em edifícios.
(…)
E ainda temos o texto da Lei que diz:
Art. 3o Os campos da atuação profissional para o exercício da arquitetura e urbanismo são definidos a partir das diretrizes curriculares nacionais que dispõem sobre a formação do profissional arquiteto e urbanista nas quais os núcleos de conhecimentos de fundamentação e de conhecimentos profissionais caracterizam a unidade de atuação profissional.
§ 1o O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil - CAU/BR especificará, atentando para o disposto no caput, as áreas de atuação privativas dos arquitetos e urbanistas e as áreas de atuação compartilhadas com outras profissões regulamentadas.
(…)
Art. 18. Constituem infrações disciplinares, além de outras definidas pelo Código de Ética e Disciplina:
(…)
IV - delegar a quem não seja arquiteto e urbanista a execução de atividade privativa de arquiteto e urbanista;
No que diz respeito as atribuições privativas de arquiteto e urbanista e as atribuições comuns às outras profissões, foi emitida a Resoluções CAU/BR 51/2013, que diz:
Art. 1°
Os arquitetos e urbanistas constituem categoria uni profissional, de formação generalista, cujas atividades, atribuições e campos de atuação encontram-se discriminados no art. 2° da Lei n°12.378, de 31 de dezembro de 2010.
Art. 2°
No âmbito dos campos de atuação relacionados nos incisos deste artigo, em conformidade com o que dispõe o art. 3° da Lei n°12.378, de 2010, ficam especificadas como privativas dos arquitetos e urbanistas as seguintes áreas de atuação:
I -DA ARQUITETURA E URBANISMO:
a) projeto arquitetônico de edificação ou de reforma de edificação;
b) projeto arquitetônico de monumento;
c) coordenação e compatibilização de projeto arquitetônico com projetos complementares;
d) relatório técnico de arquitetura referente a memorial descritivo, caderno de especificações e de encargos e avaliação pós-ocupação;
e) desempenho de cargo ou função técnica concernente à elaboração ou análise de projeto arquitetônico;
f) ensino de teoria, história e projeto de arquitetura em cursos de graduação;
g) coordenação de curso de graduação em Arquitetura e Urbanismo;
h) projeto urbanístico;
i) projeto urbanístico para fins de regularização fundiária;
j) projeto de parcelamento do solo mediante loteamento;
k)projeto de sistema viário urbano;
l) coordenação e compatibilização de projeto de urbanismo com projetos complementares;
m) relatório técnico urbanístico referente a memorial descritivo e caderno de especificações e de encargos;
n) desempenho de cargo ou função técnica concernente à elaboração ou análise de projeto urbanístico;
o) ensino de teoria, história e projeto de urbanismo em cursos de graduação;
II -DA ARQUITETURA DE INTERIORES:
a) projeto de arquitetura de interiores;
b) coordenação e compatibilização de projeto de arquitetura de interiores com projetos complementares;
c) relatório técnico de arquitetura de interiores referente a memorial descritivo, caderno de especificações e de encargos e avaliação pós-ocupação;
d) desempenho de cargo ou função técnica concernente à elaboração ou análise de projeto de arquitetura de interiores;
e)ensino de projeto de arquitetura de interiores;
III -DA ARQUITETURA PAISAGÍSTICA:
a) projeto de arquitetura paisagística;
b) projeto de recuperação paisagística;
c) coordenação e compatibilização de projeto de arquitetura paisagística ou de recuperação paisagística com projetos complementares;
d) cadastro do como construído (as built) de obra ou serviço técnico resultante de projeto de arquitetura paisagística;
e) desempenho de cargo ou função técnica concernente a elaboração ou análise de projeto de arquitetura paisagística;
f) ensino de teoria e de projeto de arquitetura paisagística;
IV -DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO CULTURAL E ARTÍSTICO:
a) projeto e execução de intervenção no patrimônio histórico-cultural e artístico, arquitetônico, urbanístico, paisagístico, monumentos, práticas de projeto e soluções tecnológicas para reutilização, reabilitação, reconstrução, preservação, conservação, restauro e valorização de edificações, conjuntos e cidades;
b) coordenação da compatibilização de projeto de preservação do patrimônio histórico-cultural e artístico com projetos complementares;
c) direção, condução, gerenciamento, supervisão e fiscalização de obra ou serviço técnico referente à preservação do patrimônio histórico-cultural e artístico;
d) inventário, vistoria, perícia, avaliação, monitoramento, laudo e parecer técnico, auditoria e arbitragem em obra ou serviço técnico referente à preservação do patrimônio histórico-cultural e artístico;
e) desempenho de cargo ou função técnica referente à preservação do patrimônio histórico
cultural e artístico;
f) ensino de teoria, técnica e projeto de preservação do patrimônio histórico-cultural e artístico;
V -DO PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL:
a) coordenação de equipe multidisciplinar de planejamento concernente a plano ou traçado de cidade, plano diretor, plano de requalificação urbana, plano setorial urbano, plano de intervenção local, plano de habitação de interesse social, plano de regularização fundiária e de elaboração de estudo de impacto de vizinhança;
VI -DO CONFORTO AMBIENTAL:
a) projeto de arquitetura da iluminação do edifício e do espaço urbano;
b) projeto de acessibilidade e ergonomia da edificação;
c) projeto de acessibilidade e ergonomia do espaço urbano.
Art. 3°
As demais áreas de atuação dos arquitetos e urbanistas constantes do art. 2° da Lei n° 12.378, de 2010, que não lhes sejam privativas nos termos do art. 2° desta Resolução, constituem áreas de atuação compartilhadas entre os profissionais da Arquitetura e Urbanismo e os de outras
profissões regulamentadas.
Art. 4°
Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, asseguradas aos técnicos de nível médio ou de 2°grau as prerrogativas conferidas pelo Decreto n° 90.922, de 6 de fevereiro de 1985.
Não quero alimentar nenhuma rixa entre profissões, mas sim esclarecer o que diz a Lei Brasileira e, principalmente, esclarecer a você, o consumidor, sobre minha profissão. Sei que temos muito pra lutar e muitas outras questões pra resolver entre o CREA e o CAU. Estamos engatinhando ainda.
Eu me despeço aqui, mas lembre-se: Antes de iniciar qualquer operação em construção civil, consulte um profissional registrado, ele tem o poder de fazer você não perder tempo nem dinheiro.
Até Quarta-feira que vem!
Referências e agradecimentos: